Caras leitoras, continuemos
a reflexão sobre perdão, de autoria do pastor e escritor Ed René Kivitz.
Ele segue sua reflexão nos ensinando o seguinte:
"Estou ciente das propostas
terapêuticas, especialmente aquelas que sugerem a necessidade de re–significar
a história e seus momentos específicos: voltar nos eventos traumáticos e dar a
eles novos sentidos. Creio também na cura pela fala. Admito que a tomada de
consciência e a possibilidade de uma nova consciência produzem libertações, ou,
no mínimo, alívios, que de outra maneira dificilmente nos seriam possíveis.
Mas, por outro lado, posso testemunhar quantas vezes já assisti esse filme e o final
não foi nada feliz.
Minha conclusão é simples (espero que não simplória): o que
faz a diferença para a experiência do perdão não é a qualidade do processo de
fazer acordos a respeito dos fatos que determinaram o distanciamento, mas a
atitude dos corações que buscam a reaproximação.
Em outras palavras, uma coisa
é olhar para o passado com a cabeça, cada um buscando convencer o outro de sua
razão, e, bem diferente, é olhar para o outro com o coração amoroso, com o desejo
verdadeiro do abraço perdido, independentemente de quem tem ou deixa de ter
razão.
Abraços criam espaço para acordos, mas a tentativa de celebrar acordos
nem sempre termina em abraços.
Essa foi a experiência entre
José e seus irmãos. Depois de longos anos de afastamento e uma triste história
de competições explícitas, preferências de pai e mãe, agressões, traições e
abandonos, voltam a se encontrar no Egito: a vítima em posição de poder contra
seus agressores.
José está diante de um dilema: fazer justiça ou abraçar.
Deseja abraçar, mas não consegue deixar o passado para trás. Enquanto fala com
seus irmãos sai para chorar, e seu desespero é tal que todos no palácio escutam
seu pranto. Mas ao final se rende: primeiro abraça e depois discute o passado.
Essa é a ordem certa. Primeiro, porque os abraços revelam a atitude dos
corações, mais preocupados em se (re)aproximar do que em fazer valer seus
direitos e razões.
Depois, porque, no colo do abraço o passado perde força e as
possibilidades de alegrias no futuro da convivência restaurada esvaziam a
importância das tristezas desse passado funesto.
Quando as pessoas decidem
colocar suas mágoas sobre a mesa, devem saber que manuseiam nitroglicerina
pura. As palavras explodem com muita facilidade, e podem causar mais destruição
do que promover restauração.
Não são poucos os que se atrevem a resolver
conflitos, e no processo criam outros ainda maiores, aprofundam as feridas que
tentavam curar, ou mesmo ferem novamente o que estava cicatrizado. Tudo depende
do coração.
O encontro é ao redor de pessoas ou de problemas? A intenção é a
reconciliação entre as pessoas ou a busca de soluções para os problemas?
Por
exemplo, quando percebo que sua dívida para comigo afastou você de mim, vou ao
seu encontro em busca do pagamento da dívida ou da reaproximação afetiva? Nem
sempre as duas coisas são possíveis.
Infelizmente, minha experiência mostra que
a maioria das pessoas prefere o ressarcimento da dívida em detrimento do
abraço, o que fatalmente resulta em morte: as pessoas morrem umas para as
outras e, consequentemente, as relações morrem também.
A razão é óbvia: dívidas
de amor são impagáveis e somente o perdão abre os horizontes para o futuro da
comunhão.
Ficar analisando o caderno onde as dívidas estão anotadas, discutindo o que é justo e injusto, quem prejudicou quem e quando, pode
resultar em alguma reparação de justiça, mas isso é inútil – dívidas de amor
são impagáveis.
Mas o perdão tem o dia
seguinte. Os que recebem perdão e abraços cuidam para não mais ferir o outro.
Ainda que desobrigados pelo perdão, farão todo o possível para reparar os danos
do caminho.
Mas, já não buscam justiça. Buscam comunhão. Já não o fazem porque
se sentem culpados e querem se justificar para si mesmos ou para quem quer que
seja, mas porque se percebem amados e não têm outra alternativa senão retribuir
amando.
As experiências de perdão que não resultam na busca do que é justo
desmerecem o perdão e esvaziam sua grandeza e seu poder de curar.
Perdoar é
diferente de relevar. Perdoar é afirmar o amor sobre a justiça, sem jamais
sacrificar o que é justo.
O perdão coloca as coisas no lugar. E nos capacita a
conviver com algumas coisas que jamais voltarão ao lugar de onde não deveriam
ter saído.
Sem perdão não existe amanhã."
(By
Ed René Kivitz)